„Era uma vez uma época, e ela não está muito longe, em que também aqui se podia fazer sucesso com um bocadinho de ironia, que compensava todas as lacunas em outros aspectos, favorecia alguém com honrarias e lhe dava a reputação de ser culto, de compreender a vida e o caracterizava ante os iniciados como membro de uma vasta franco-maçonaria espiritual. Ainda nos deparamos de vez em quando com um ou outro representante deste mundo desaparecido, que conserva este fino sorriso, significativo, ambiguamente revelador de tanta coisa, este tom de cortesão espiritual, com o qual ele fez fortuna em sua juventude e sobre o qual construiu todo o seu futuro, na esperança de ter vencido o mundo. Mas ah! foi uma decepção! Em vão procura seu olhar explorador por uma alma irmã, e caso a época de seu esplendor não estivesse ainda fresca na memória de um ou de outro, suas caretas permaneceriam um enigmático hieroglifo para uma época na qual ele vive como hóspede e estrangeiro.  Pois nosso tempo exige mais, exige se não um pathos elevado, pelo menos altissonante, se não especulação, pelo menos resultados; quando não verdade, pelo menos convicção, quando não sinceridade, pelo menos protestos de sinceridade; e, na falta de sensibilidade, pelo menos discursos intermináveis a respeito desta. Por isso, nosso tempo cunha uma espécie bem diferente de rostos privilegiados. Não permite que a boca se feche obstinada, ou que o lábio superior trema com ar travesso, ele exige que a boca fique aberta; pois como poderíamos imaginar um verdadeiro e autêntico patriota, senão discursando, o rosto dogmático de um pensador profundo, senão com uma boca que fosse capaz de engolir o mundo todo; como nos poderíamos representar um virtuose da copiosa palavra vivente, senão com a boca escancarada? Ele não permite que paremos quietos e nos aprofundemos; andar devagar já desperta suspeita; e como nos poderíamos contentar com isso no instante movimentado em que vivemos, não época prenhe do destino, que, como todos reconhecem, está grávida do extraordinário? Nosso tempo odeia o isolamento, e como suportaria que um homem chegasse à ideia desesperada de andar sozinho através da vida, esse nosso tempo, que de mãos e braços dados (como membros viajantes das corporações de ofício e soldados rasos), vive para a ideia da comunidade?“
„Poema – O Equinócio part 2 Não sou um homem de virtudesTampouco acredito que desta vida Levarei alguma honraria Morrerei tal como tenho vivido Um Diabo a dançar nas labaredas Do meu próprio inferno Estou hoje convencido de todas as minhas incertezas Lúcido como um homem que perdeu a razãoNunca obtive sucesso na vida Destas falhas que colecionei por este longo caminhoTransformei o meu ninho de desprezo e decepçõesEm um paraíso de Tolos e SuicidasSe a criança que eu fui um dia Soubesse o monstro que eu me torneiArrancaria suas próprias tripas com as mãosE se enforcaria até que não sobrasse um único suspiro;E há tantos caminhos que eu poderia ter percorrido Mas quais destes caminhos me levariam ao céu?Se a alma que um dia eu tive A vendi só pelo prazer de vê-la queimar!Aonde se perdeu aquela inocente criança?Que dizia com lágrimas em seus olhos‘”Subirei aos céus e erguerei o meu tronoacima do cadáver de Deuseu me assentarei no monte da assembleia no ponto mais elevado e matarei todos os arcanjos Subirei mais alto que as mais altas nuvens serei como o Altíssimo espirito santo”Mas fui condenado as profundezas de SheolE fui levado ao mais profundo abismo!Eu que sempre sonhei em ser o filho da alvorada!Sou hoje a escuridão no coração dos loucos e dos suicidas (…)‘’ Na ala psiquiátrica a insanidade e a razãoTiveram um filho e o chamaram de DeusHoje devo chama-lo de paiPorque estas são as chamas da minha loucura’’O mundo é feito para as almas que desejam viverNão para os suicidas que mutilam seu próprio corpoCom a esperança de que algum dia fecharão os seus olhosE a morte beijará os seus lábios Tenho sonhado todas as noites com uma nova vidaUm novo rumo, até mesmo um novo nomeFilosofei com sofistas e poetas gregos Sobre a origem e o renascimento do universoDialoguei com cristo sobre o seu sacrifício E invejei seu amor pelos homens Nesta longa jornada descobri que sou só uma criançaCom medo do escuro e sonhos que nunca vão se realizarSerei sempre esta alma vazia Sentada no lado escuro da LuaAdmirando a luz das estrelasQue há muito tempo já se apagou…- Gerson De Rodrigues“